sábado, 2 de agosto de 2008

No silêncio da noite


NO SILÊNCIO DA NOITE (In a lonely place), Nicholas Ray


Negro. Negro é o filme, negro é o passado de Dixon Steele que, ao invés de esconder algo perverso, guarda desejos, desejos que foram tragados pelo tempo. Não que No silêncio da noite mostre que Dix chegara cheio de sonhos e esperanças ao mundo do cinema (mundo? mundo.), mas a melancolia dos ensejos frustrados da personagem estão estampados em alto-relevo na expressão quase majestosa de Humphrey Bogart. Mas como culpar um trabalhador (e se eu digo trabalhador e não escritor porque a ótica que o filme propõe não se limita à old hollywood) que é vítima do próprio sistema, que desmotiva e substitui? Se os velhos são colocados de lado para que os motores da fábrica (de filmes) recebem óleo novo, como persistir na idéia de que “um dia farei algo bom”? Numa luta constante contra o tempo, Dix Steele está apanhando, e, com o passar dos dias, vagarosamente, se torna um fracassado.

E tem esse homem, Dixon Steele, que é um escritor de cinema que se sente constantemente fracassado, e aí ele recebe a proposta de fazer uma adaptação de um livro para o cinema, um livro que ele acha muito ruim e que aumenta sua sensação de desconforto com o sistema que o controla. E aí...

Clara. Clara é a mulher, claro é anjo, que dá falta de contraste (porque ela é clara, iluminada demais!) toma a forma do próprio contraste, estabelecendo-se como o extremo oposto de Dix. Laurel Gray é suave, tão suave como uma jovem mulher sonhadora pode ser. Por muitas vezes é inexpressiva, mas quem precisa de expressão em um filme onde ela está diretamente ligada ao fracasso, à melancolia? Não, eu vou ficar com a maciez da jovem Gray (e os holofotes ficam sobre ela também, e todo mundo percebe!). A conexão entre o preto e o branco é imediata. Laurel e Dix se apaixonam e se desejam e ela se transforma em sua musa inspiradora e finalmente resolve deixar a desmotivação para trás e começa a se dedicar ao trabalho de (trabalhar; viver) escrever.

Assassinato! Dix levou a jovem e inocente Mildred Atkinson para sua casa, porque ele queria que ela contasse pra ele a história do livro, porque ele tava tão chateado mas tão chateado com a idéia de adaptar algo tão ruim, que nem queria se dar ao trabalho de ler. Mas quando ela voltava de taxi para a casa, ela foi brutalmente assassinada, covardemente arremessada pra fora de um carro em movimento. O suspeito primordial do crime foi o Dix, né. Aí, já viu...

Suspeito de cometer um crime, Dix faz piadas e se mostra indiferente à trágica morte da jovem. Ele culpa sua experiência (em contos de crime e mistério) pelas mórbidas brincadeiras em relação ao assassinato em questão e são essas experiências a chave para se TENTAR entender a mente do escritor. “Já matei dúzias de pessoas... nos filmes”, ele diz, sem perceber que com essa única frase Dix enterra qualquer oportunidade de argumentação sobre seu sucesso profissional, pois, apesar do tempo ter se passado o suficiente para que ele pudesse ter dado fim a dúzias e mais dúzias de vidas... nos filmes, ele ainda “não é ninguém”. Ninguém. Vítima daquilo que o cerca, Dix há muito ultrapassou a Travessa da última gargalhada, e sem rir, endureceu e endureceu, até que a maldição de seu próprio nome caísse sobre si, Dix Steele é agora duro como aço e, o twist que esse metal, a pressão (dos policiais) e a desconfiança (da namorada) criam dão origem a um licor amargo e rude, que o homem bebe com prazer, na sua busca por um sentido à sua agora fracassada vida.

Todo mundo começou a desconfiar dele, a acusar o pobre coitado e aí ele fica violento mesmo, fazer o que, até bateu em um cara na estrada. Só que aí, ah é, tem uma garota que ele conhece, e quer se casar com ela, mas ela não quer porque acha que foi ele que matou a menina, a Atkinson. Aí a Lauren – é a garota – tenta fugir, mas ele não deixa e quando descobre fica tão nervoso que tenta matar ela!

“Menosprezado pela fortuna e pelas pessoas, em minha solidão lamento meu desterro, e clamo aos céus com um pranto inútil. Olho pra mim mesmo e amaldiçôo meu destino.” O poema citado pelo ator fracassado Charlie Waterman continua como uma ode ao amor, mas a parte que Dix recebe é tão somente essa e, talvez, ele mesmo tenha ficado acordado apenas para ouvir a composição que foi feita pra ele. Entre “ele não é ninguém” e “você não admite”, Dix personifica o resultado da falha por conseguinte da cobrança de um homem. Dix é o pai de família que, sujo e suado, pega o ônibus de noite pra chegar em casa, comer um pedaço de carne tão sujo e suado como ele próprio, e que só tem tempo de colocar a cabeça no travesseiro pra acordar cedo no dia seguinte. É um fracassado. Um perdedor. Ainda que não admita, é um perdedor. Persiste sempre na luta por uma vida menos ordinária, mas ainda sim, é um perdedor. Afogado em ignorância e rancor, é um derrotado. Derrotado pelas pessoas. Derrotado pelo tempo. Derrotado pela vida

(mas não tem culpa disso).

Ring! O telefone toca e aí ele percebe que tá machucado a Lauren, aí ele para e vai embora, aí ela chora. É ou não é aquilo que eu chamaria de uma epopéia?

domingo, 6 de julho de 2008

Onde os fracos não têm vez


ONDE OS FRACOS NÃO TÊM VEZ (No country for old men), Joel e Ethan Coen


Um misto da tranqüilidade dos ranchos texanos com uma narração que é, acima de tudo, fria, engole a trama de Onde os fracos não têm vez e entregam ao expectador uma ópera silenciosa, que fala sobre como o mundo está, definitivamente, acabando.

Anton Chigurh é o primeiro personagem a ser apresentado, aparecendo logo no começo sendo escoltado por um patrulheiro até a delegacia. Algo na atitude dele denuncia que ele não foi simplesmente preso, porque como a gente ia ver mais pra frente, o cara é simplesmente inatingível. Talvez ela se deixado capturar, só pra ver como é que é. Na delegacia, tédio, Chigurh se cansa, enforca o patrulheiro, acaba cortando os pulsos nessa brincadeira, mas nenhum gemido, nenhuma expressão, ele simplesmente pega sua arma, que agora é clássica, e vai embora.

Moss é apresentado em seguida. Ele é talvez alguma coisa, mas no momento estava só se dedicando à caça, sem muito sucesso. Numa seqüência que é de arrepiar, só pela forma como os Irmãos a conduzem, Moss atira num animal, erra, vê um cachorro ferido que deixa um rastro de sangue, acaba encontrando então um cenário apocalíptico de algo que provavelmente foi uma negociação de drogas mal decidida, depois nota que está faltando um cadáver ali – já que são cinco veículos, pressupõem-se então que haja pelo menos dez pessoas – e vai a sua procura, acha, espera só pra ver se está realmente morto, confere e encontra, finalmente, uma maleta contendo dois milhões de dólares. Dois milhões de dólares. Ele pensa se leva a maleta ou não, e se decide: sua vida acabou, Moss, ele diz, e vai embora.

Se toda história tem que ter um herói, o xerife Bell faz esse papel em Onde os fracos não têm vez. Mas Bell é um herói machucado pela guerra e, acima de tudo, humano, capaz de confundir coragem com estupidez. Com o assassinato de um policial e de um homem na estrada, Bell começa a caçar o caçador, Chigurh, afim de prendê-lo antes que ele cause mais destruição. Descobre depois o mesmo cenário apocalíptico que Moss e fica com a certeza de que havia dinheiro ali, e alguém o pegou e esse alguém estava em encrenca. Então, paralelamente a sua busca por Chigurh, ele busca Moss para tentar impedi-lo de permanecer com a maleta de dois milhões de dólares.

Mas a trama de perseguição só camufla o sentido real do filme, que é de mostrar um velho, xerife Bell, tentando parar de uma forma ou de outra o assassino Chigurh, paralelamente mostrando a visão de Bell sobre a vida, como naqueles sete minutos em que Bell conversa com um antigo amigo, numa seqüência que é anti climática, mas é repleta de significados. Enquanto é caçado por Bell, Chigurh, que é incompreensível, horripilante, imbatível e absurdo, simbolismo perfeito de um personagem que é a própria personificação da violência nos dias de hoje. Moss e Carla Jean, sua esposa, são cidadãos comuns que não tem absolutamente nada a ver com a negociação de drogas que deu errado e com a maleta de dois milhões de dólares, mas que deram o azar de estarem no meio dessa bagunça toda.

Onde os fracos não têm vez é, então, uma abordagem pessimista (e como não ser?) da violência urbana nos dias de hoje e, se tem cenário nos anos oitenta e em locais desolados, não é apenas por luxos visuais, mas porque tenta explicar a origem de tanta perturbação e indiferença. A qualidade do filme nem se limita ao roteiro maravilhoso que possui. A força maior dessa obra está na direção dos Irmãos Coen, que voltam ao flertar com o tom noir que os revelaram em 1986, com Gosto de Sangue (e não é à toa que o pseudônimo dos irmãos na edição é o mesmo), com boas doses de melancolia e lentidão ao longo do filme. A dupla usa também, de um modo como eu não vejo há bastante tempo, o uso da imagem para contar a história. Diálogos mesmo o filme tem pouco, mas as imagens falam pelas palavras, em cenas como Chigurh conferindo as solas das botas, por exemplo. O fator mais comentado, provavelmente, o som, é tão arrebatador quanto o vilão da trama. O telefone tocando ao fundo, os apitos do transponder e os tiros das armas gigantes que destroem a calmaria da cena do primeiro confronto entre Moss e Chirgurh é um bom exemplo do cuidado apuradíssimo que a equipe do filme teve nessa área.

A história de Onde os fracos não têm vez em uma frase por personagem (spoilers)

Moss acha a maleta por acidente, descobre que já têm pessoas à sua procura, decide fugir, deixa Carla Jean com a mãe, vai para Del Rio, se hospeda em um hotel, guarda a maleta no duto de ventilação, sai por um tempo, volta à noite, descobre por causa da cortina entreaberta que há alguém no seu quarto à sua espera, pega então outro quarto, compra uma arma, pega a maleta no duto de ventilação, vai para outro hotel e lá enfrenta Chigurh, se fere mas consegue escapar, vai parar num hospital, conversa com o homem que foi contratado para matar Chigurh, vai para El Paso esperar por Carla Jean e é assassinado.

Chigurh é preso, mata um policial pra sair da prisão, se encontra com dois comparsas, eles lhe dão o transponder, ele os mata, depois vai para a casa de Moss, deduz pela sua conta de telefone que ele está em Odessa ou Del Rio, ele vai para Del Rio e anda pela cidade até o transponder dar sinal próximo a um hotel, ele entra então no quarto de Moss, três mexicanos estão lá, ele os mata mas não acha o dinheiro porque ele foi retirado antes do duto de ventilação, segue mais uma vez o transponder, enfrente Moss mas é ferido, se trata, vai para El Paso onde Moss foi assassinado, abre o duto de ventilação, encontra a maleta, vai atrás de Carla Jean, a mata e depois vai embora.

Bell investiga o policial morto por Chigurh, se envolve na chacina do deserto, descobre que Moss pegou o dinheiro da negociação frustrada, vai atrás de Moss para livrá-lo do perigo, o encontra morto no hotel assassinado pelos mexicanos, volta ao hotel à noite enquanto Chigurh está lá, não encontra nada, vai a casa de seu conhecido, se aposenta, sonha e conta o sonho pra Loretta.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

O show deve continuar (All that jazz, Bob Fosse, 1979) - sem nota


O SHOW DEVE CONTINUAR (All that jazz), Bob Fosse

O comentário abaixo foi escrito para uma prova, cujo objetivo era falar sobre o filme sem citar diretamente o filme, o resultado:

Começando sua carreira como o de costume, o diretor desse filme costumava mendigar pequenas participações no teatro de sua cidade. E como cada semente rende um fruto, não demorou muito para que ele estivesse no controle de sua própria peça. E como sementes grandes geram frutos grandes, logo esse gênio já havia deixado a Broadway para trás, tendo como objetivo somente mais uma inédita ambição em sua vida: o Oscar.
Não foi com este filme que esse diretor conseguiu seu primeiro Oscar. Foi antes. Mas esse filme faturou o que talvez seja o maior e mais respeitado prêmio da industria cinematográfica. E não é difícil descobrir porque.
Um homem de meia idade, pai de uma filha é disputado por duas de suas ex-esposas. O detalhe mais importante, porém reside na profissão deste homem. Um diretor de filmes. E é aí que começa o grande show desse filme: a intenção de mostrar um lado podre do show business. Mas aqui não há o glamour nem fama, pois somos inseridos aos bastidores do mundo do entretenimento. “Acabamos de perder o público familiar”, é o que conclui um executivo em meio uma apresentação, sem dar qualquer sinal de estar tentando entender o que está sendo transmitido ali. Não, tudo o que importa é o dinheiro, o retorno, a segurança no investimento, enfim, ele está ali apenas para dar mais uma facada na arte.
Se os executivos funcionam como representações do sistema capitalista que tomou conta do mundo artístico, nosso pobre protagonista tem seus impulsos criativos frustrados pelo resultado da falta de credibilidade dos seus investidores, da crítica e até mesmo dos amigos mais próximos, que como ele percebe, não são amigos, apenas sanguessugas pra lá de falsas, que agem apenas por interesse, fato que fica claro em uma cena extremamente bem conduzida, na qual todos riem do roteiro escrito pelo protagonista, exceto sua própria ex-esposa, que como ele vem a descobrir, ficou sempre com ele, dando apoio para as boas decisões e tentando reconquistar a sua estima.
Esse filme brinca com os sentimentos e as escolhas das pessoas que (assim como o protagonista), de alguma maneira não tiveram autonomia suficiente para trilhar o caminho de fato desejado, e que se vêem em um mundo desconhecido, tendo como fim da linha apenas a surpresa desagradável de que tudo vivido até ali, não passava de pura perda de tempo, mas, aí já será tarde demais para voltar atrás e tentar passar mais tempo com aqueles que realmente (se) importam.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Paranoid Park



PARANOID PARK, Gus Van Sant

Seus pais estão se separando e algo em sua vida está se transformando, porém, Alex não sabe exatamente o que. Ele até gostaria de falar sobre isso com alguém, mas acha que seria egoísmo de sua parte, levando em consideração que o noticiário na televisão e os jornais estampam o sensacionalismo, incitando as pessoas a terem dor, a terem preocupações e a terem ódio. O mundo está em guerra, as pessoas estão se matando e os skatistas do Paranoid Park (aqueles sim sabem o que é sofrer de verdade) estão... Lá.
É a educação repressiva que impõe aos jovens a idéia errada de que é um fardo para eles também carregarem as guerras, fomes, viciados, privando-os de suas próprias enfermidades. A bagunça no universo jovem de Alex é tanta, que ele se isola, tranca-se dentro de si mesmo, dentro do Paranoid Park – o lugar para o qual ninguém está pronto e, em silêncio, fala.
Como conseqüência de suas visitas ao skate park, Alex se envolve em um acidente, causa a morte de um homem, um fato que se agrega à sua teia de problemas, e aí, mais confusão, perturbação e silêncio fazem parte de sua rotina. Antes, ele não conversava para não se passar por egoísta (entrando num jogo de aparências e comportamento aqui, já que na verdade ele não se importa com um mundo que não seja o seu), mas agora, ele não se abre, por ter feito algo errado.
Paranoid Park existe em função de uma carta que Alex escreve para a amiga, apenas como pretexto para tirar de cima dos ombros o peso de sua atitude imprudente no acidente. Mas curiosamente, na carta – no filme – a morte do homem assume o segundo plano da narrativa. O lápis, a peça que assume o papel do link que conecta Alex ao mundo dos que se exprimem, não consegue evitar o desabafo e, ao mundo, Alex conta sobre seus problemas em relação à família, a situação delicada em que vivem os seus pais, seu relacionamento plástico e isolado com os amigos e a namorada. No final, o seu grito vai ao fogo e o jovem volta às suas origens oprimidas, unindo a sua voz com a de outros, que se expressam, não com a boca, mas com atitudes, por horas infantis, outras rebeldes, mas acima de tudo, livres.

segunda-feira, 31 de março de 2008

Balanço do mês - Março 2008

março revisto
067. There will be blood (There will be blood, Paul Thomas Anderson, 2007) – 5/5
068. O cheiro do ralo (idem, Heitor Dhalia, 2007) – 4/5
069. As férias de Monsieur Hulot (Les vacances de Monsieur Hulot, Jacques Tati, 1953) – 3,5/5
070. Meu tio (Mon oncle, Jacques Tati, 1958) – 4,5/5
071. Play time (Play time, Jacques Tati, 1967) – 3/5
072. magnólia (magnolia, Paul Thomas Anderson, 1999) – 5/5
073. Uzumaki (Uzumaki, Higuchinsky, 2000) – 3/5
074. Fuckin Amal (Fuckin Amal, Lycas Moodysson, 1998) – 4,5/5
075. Embriagado de amor (Punch-drunk love, Paul Thomas Anderson, 2002) – 5/5
076. Tragam-me a cabeça de Alfredo Garcia (Bring me the head of Alfredo..., Sam Peckinpah, 1974) – 4,5/5
077. Caché (idem, Michael Haneke, 2005) – 5/5
078. Cruz de ferro (Cross of iron, Sam Peckinpah, 1976) – 5/5
079. Scanners – Sua mente pode destruir (Scanners, David Cronenberg, 1981) – 4/5
080. Um corpo que cai (Vertigo, Alfred Hitchcock, 1958) – 4,5/5
081. Depois do vendaval (The quiet man, John Ford, 1952) – 4/5
082. Viagem à lua (Le voyaje dans la lune, George Meliés) – 3/5
083. Pistoleiros do entardecer (Ride the high country, Sam Peckinpah, 1962) – 4,5/5
084. Paprika (idem, Tinto Brass, 1991) – 3,5/5
085. Vampiros de almas (Invasion of the body snatchers, Don Siegel, 1956) – 4,5/5
086. Jogada de risco (Sydney, Paul Thomas Anderson, 1996) – 3,5/5
087. Whisky (idem, Juan Pablo Robella, 2004) – 4,5/5
088. Atirem no pianista (Tirez sur le pianiste, François Truffaut, 1960) – 4/5
089. Antoine et Colette (idem – seguimento de Amor aos vinte, François Truffaut, 1962) – 5/5
090. Acossado (À bout de suffle, Jean-Luc Godard, 1960) – 4/5
091. Uma mulher é uma mulher (Une femme est une femme, Jean-Luc Godard, 1961) – 5/5
092. Pierrot le fou (Pierrot le fou, Jean-Luc Godard, 1965) – 5/5
093. O grande golpe (The killing, Stanley Kubrick, 1956) – 3,5/5
094. A rosa púrpura do Cairo (The purple rose of Cairo, Woody Allen, 1985) – 5/5
095. Manhattan (idem, Woody Allen, 1979) – 4,5/5
096. Prelúdio para matar (Profondo rosso, Dario Argento, 1975) – 5/5
097. Inferno (idem, Dario Argento, 1980) – 3,5/5
098. Violência gratuita (Funny games, Michael Haneke, 1997) – 5/5
099. La terza madre (idem, Dario Argento, 2007) – 4,5/5
100. Meu tio matou um cara (idem, Jorge Furtado, 2005) – 2,5/5
101. Elefante (Elephant, Gus Van Sant, 2003) – 4,5/5
102. Paranoid Park (idem, Gus Van Sant, 2007) – 5/5

103. Gerry (idem, Gus Van Sant, 2002) – 3/5
104. O misterioso assassinato em Manhattan (Manhattan murder mistery, Wood Allen, 1993) – 5/5

terça-feira, 11 de março de 2008

Embriagado de amor

Cor azul: relativa a monotonia e depressão.
Cor vermelha: relativa a paixão, a vida e a agitação.
Cor branca: relativa a paz, calma e ordem.
Cor amarela: relativa a paz.
Cor roxa: relativa a liberdade, tenacidade e audácia.

Número sete: Relativa a pessoa exigente consigo mesma e com o próximo. A pessoa regida por esse número tende a executar suas tarefas impecavelmente, é solitária pois se isola e exige muito tempo para se entregar a qualquer tipo de relacionamento. É auto-crítico, recluso, pobre, introxpectivo, perfeccionista e tem alto controle da mente.

Número quatro: Relativo a pessoas que lidam bem com hierarquia e burocracia, o que as valoriza muito no trabalho. Atividades relacionadas a organização, discriminação, repetição mecânica e grande espírito de sacrifício pelo trabalho estão presentes em pesoas regidas por esse número. Elas são também requisitadas para darem apoio e proteção aos outros.

Pudim: Do inglês pudding, que significa tanto o doce quanto um tipo de rocha conglomerada, que é, por sua vez, várias rochas que eram originalmente separadas, mas se juntaram com o tempo.



Embriagado de amor - Punch-drunk love (Paul Thomas Anderson, 2002)


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A gravata azul


No azul do terno, das salas e do céu, Berry Egan (Adam Sendler) mimetiza a normalidade e esconde a essência de seu ser das pessoas. O azul que é simbológicamente a cor da monotonia e da depressão veste o mundo do personagem revelando para nós, expectadores desse jogo magnificamente otimista do diretor Paul Thomas Anderson, a verdadeira personalidade do sujeito. Mas quando naquela manhã, Berry deixa o cômodo escuro no qual trabalha, as nuvens escarlates no céu já anunciam a chegada da agitação na vida do homem e, sob a forma de um acidente, que é repentino e inesperado, ela finalmente chega. Vestida do vermelho da cor daquelas nuvens, em um carro branco, Lena Leonard aterriza no trágico ambiente em que Berry vive, pincelando-o e, consequentemente, mudando-o para sempre.

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Um orgão abandonado na rua. Uma falha de marketing. Berry Egan no meio, se agarrando com todas as suas forças a essas duas novidades. Ele rouba o piano e coloca-o no centro do seu escritório que é, tragicamente, o centro de sua vida. Até tenta tocá-lo, mas o som ainda é desordenado. Mas da falha matemática de marketing, que é teórica, Berry compreede muito bem. Ele não viaja e nem o quer, mas das milhas aéreas pelo resto da vida ele não parece querer abrir mão. Imersa em seu trabalho, em seu orgão e nas milhas aéreas, a vida de Berry Egan ainda é solitária e, buscando conforto, ele liga para o sex line.

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A gravata vermelha da cor das nuvens


No dia seguinte ao seu primeiro encontro com Lena, Berry começa a estampar na sua vida o amor que, como os interlúdios animados de Embriagado de amor parecem gritar, estava escrito nas estrelas. Em seu apartamento pálido, com proporções Jacquestatianas, o escarlate parece constratar e é nesse momento em que a subtrama agitada de chantagem e suspense aparece. Georgia, a garota do sex line quer dinheiro e Berry pagará caro pelo seu telefonema.

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No dia anterior, Berry decidiu ir ao supermercado aproveitar a falha de marketing da empresa, o que garanteria para ele, milhas aéreas gratuitas pro resto da vida. No mercado, enquanto procura pelo melhor produto, a garota escarlate Lena Leonarda assume a forma de um borrão no fundo da tela, e o borrão, segue, ainda que distante, o compasso dos passos de Berry. O amor obsessivo do (futuro) casal começa a se formar.

No escritório, o orgão, ao centro, encontra-se superficialmente estragado e Berry o concerta e o toca, mas o som ainda é desajustado e, este som desajustado se funde com a trilha do filme quando a irmã de Berry, Rhonda, chega ao trabalho do irmão acompanhada da moça escarlate, Lena, que agora, vestida de roxo, personifica o apego, a perseverança e a audácia. Berry e Lena então, entorpecidos com o orgão, com os pudins, com o crying problem, com os acidentes da empilhadeira e com a trilha, marcam um encontro.

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A gravata roxa


No primeiro encontro, Berry e Lena, de vermelho vivo, estão iluminados, a conversa e as gargalhadas fluem bem, até Lena mencionar as irmãs. A pressão que as sete (eu disse sete) irmãs. A fúria reprimida começa a exalar pelos poros de Berry e ele descarrega sua raiva do banheiro do restaurante. O maître do restaurante expulsa-o então do restaurante e, na rua, o casal se assume e se compreende. A noite, com pinceladas vermelhas e azuis encanta e, dentro do carro, Lena imerge em Berry, sua luz assume todo o veículo, toda paisagem, todo o rosto de Lena e ali o casal tem o seu momento sublime do amor, que nenhuma cena de sexo seria digna de substituir.

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Na mesma noite, quatro cavalheiros loiros sequestraram Berry e exigiram que ele entregasse algum dinheiro. Os quatro cavaleiros são contratados da empresa fajuta de sex line, liderada pelo ogro-rock-star Dean. Com a posse de todas as informações pessoas de Berry, os quatro cavalheiros loiros ameaçam voltar, para aterrorizá-lo e extorqui-lo.

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A gravata vermelho vivo


A intimidade do seu caso com Lena está ficando mais forte, e, pressionado com as ameaças, agressões e stress, Berry decidi ir para o Havai para encontrá-la.

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Interlúdio: a gravata amarela


Amarelo, que é assossiado à paz, colore o peito de Berry que, se liberando da pressão de sua rotina reclusa, prepara-se para as férias não programadas.

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A gravata vermelho vivo - continuação


Pare. Após o intervalo pacífico, o diretor Paul Thomas Anderson entra no filme, não como um personagem humano, mas como algo surreal. Nada pode dar errado nas férias de Berry no Havai porque o diretor assume o comando do tempo-espaço. O dia está claro, Berry telefona para sua irmã Rhonda e, pela primeira vez em um confronto familiar, sai vencedor. O prêmio, o telefone do hotel em que Lena está hospedada. O dia começa a escurecer, mas a cabine telefônica já sobreavisa que aquela viagem é iluminada. No encontro do casal, Lena veste branco, trazendo consigo a calma e a ordem, e a luz, a mesma luz que agora se ergue no céu novamente. Um lanche à beira da praia, pouca conversa, muito sentimento, o dia começa a escurecer novamente e a lamparina vermelha na mesa guia os dois. Para o quarto. E está lá novamente, o dia claro e Berry, sempre tão reprimido, extravazando sua essência pela tela novamente. A "primeira noite" do casal que ironicamente acontece à luz do dia. Mas as coisas ainda não estão totalmente resolvidas...

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A gravata vermelho vivo - o ogro contra o guerreiro e o final


De volta à Los Angeles, o sol se extingue e os quatro cavalheiros loiros dão as caras novamente. Mas desta vez não feriram Berry, mas a Lena. Berry sai do carro e abotoa o terno como quem veste uma armadura se preparando para a batalha. Nocaute para os quatro cavalheiros loiros, hospital para Lena e Berry vai ao telefone e liga para o sex line novamente, e mais uma vez busca conforto, só que dessa vez com sua amada. Com Dean, o surpevisor ao telefone, Berry conversa, argumenta, discute, explode, e Dean explode também e, revoltado, Berry encara o desafio e parte para D and D Mattress Man, em Utah, para encontrar com Dean, o ogro, e colocar um ponto final nessa história.

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Em Utah, o anti-climax. Não há um confronto direto entre Dean, o gro e Berry Egan. Berry, imponente, ocupando novamente a tela em forme de feixes luminosos se abre, diz que possui dentro de si o amor que o fortelece inefavelmente e aconselha que Dean reconheça sua derrota, e ele reconhece.

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Embriagado de amor não é um thriller de suspense, não é um filme de ação. É um conto de romance e o climax ainda estava por vir. Berry volta para o escritório, pega seu orgão e bate a porta de Lena, declara seu amor (à sua maneira, naturalmente) e a beija. Aí está o climax do filme. Berry abraça Lena e Lena abraça Berry e o mundo é só deles, sem Rhonda, sem Dean, sem ninguém. E no trabalho, como não poderia deixar de ser, Berry toca o orgão, que agora não emite sons desconexos e pertubadores, mas uma melodia carinhosa. Enquanto o vermelho e o azul tomam conta da imagem do casal, Lena declara que a história de amor dela e de Berry, começa, na verdade, agora. A embriaguês apaixonada aparece em forma de letras, imagem e som, e here we go.

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Filmes do mês

fevereiro
029. Onde os fracos não têm vez (No country for old men, Joel e Ethan Coen, 2007) – 5/5
030. Sweeney Todd, o barbeiro demoníaco da rua Flett (Sweeney Todd .., Tim Burton, 2007) – 3,5/5
031. Vincent (Vincent, Tim Burton, 1982) – 4,5/5
032. Encurralado (Duel, Steven Spielberg, 1971) – 2,5/5
033. Quarta B (idem, Marcelo Galvão, 2005) – 2,5/5
034. Felicidade (Happiness, Todd Solondz, 1998) – 5/5
035. Ratatouille (Ratatouille, Brad BIRD, 2007) – 4,5/5
036. Homem Aranha 2 (Spider-Man 2, Sam Raimi, 2004) – 3/5
037. Um dia de cão (Dog day afternoon, Sidney Lumet, 1975) – 5/5
038. Paranoid Park (idem, Gus Van Saint, 2007) – 5/5
039. Conduta de risco (Michael Clayton, Tony Gilroy, 2007) - 0,5/5
040. O homem que copiava (idem, Jorge Furtado, 2002) – 4,5/5
041. Redacted (idem, Brian De Palma, 2007) – 4/5
042. A noite americana (La nuit americaine, François Truffaut, 1973) – 4,5/5
043. Barton Fink (idem, Joel e Ethan Coen, 1991) – 4,5/5
044. O assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Redford (The assassi..., Andrew Dominik, 2007) – 4/5
045. O homem que matou o Facínora (The man who shot Liberty Valance, John Ford, 1962) – 5/5
046. Cloverfield – Monstro (Cloverfield, Matt Reeves, 2008) – 4,5/5
047. Hotel Chevalier (Hotel Chevalier, Wes Anderson, 2007) – 4,5/5
048. Couch (Couh, Paul Thomas Anderson, 2003) – 4/5
049. Ballchewer (Ballchewer, Paul Thomas Anderson, 2003) – 4,5/5
050. Viagem à Darjeeling (The Darjeeling Limited, Wes Anderson, 2007) – 5/5
051. There will be blood (There will be blood, Paul Thomas Anderson, 2007) – 5/5
052. Paixão dos fortes (My dearling Clementine, John Ford, 1939) – 3,5/5
053. De olhos bem fechados (Eyes wide shut, Stanley Kubrick, 1999) – 4/5
054. Cidadão Kane (Citzen Kane, Orson Welles, 1941) – 4/5
055. No tempo das diligências (Stagecoach, John Ford, 1939) – 4/5
056. O cavaleiro solitário (Pale rider, Clint Eastwood, 1985) – 4/5
057. O escafrando e a borboleta (The diving bell and the butterfly, Julian Schnabel, 2007) – 4/5
058. Lady vingança (Chinjeolhan geumjassi, Chan-Wook Park, 2005) – 4,5/5
059. Suspiria (Suspiria, Dario Argento, 1977) – 5/5
060. Pequena Miss Sunshine (Little Miss Sunshine, Jonathan Dayton e Valerie Faris, 2006) – 5/5
061. A montanha dos sete abutres (Ace in the hole, Billy Wilder, 1951) – 4/5
062. Vênus (Venus, Roger Michell, 2006) – 3/5
063. Medo da verdade (Gone baby gone, Ben Affleck, 2007) – 3,5/5
064. Ensinando a viver (Martian child, Menno Meyjes, 2007) – 1,5/5
065. O homem que amava as mulheres (L’homme qui aimait les femmes, François Truffaut, 1977) – 4,5/5
066. Quanto mais quente melhor (Some like it hot, Billy Wilder, 1959) – 3,5/5

Melhores do mês: There will be blood, Felicidade, Suspiria
Piores do mês: Conduta de risco, o resto magnífico em comparação

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Happiness, de Todd Solondz



Felicidade (Happiness, Todd Solondz, 1998) - 5/5


É um tema universal, a felicidade, é da conta de qualquer um. Mas é magnífico ao ver esse tema ser tratado de forma tão doentia por esse diretor que, ao que parece, se especializou em fazer críticas bem afiadas ao universo da classe média americana (e, let's face it, consequentimente à classe média de qualquer país). Durante uma passagem maravilhosa do filme, a personagem Joy - nome altamente sugestivo cof cof - canta "happiness where are you? I've searched so long for you", derramando tristeza, a poucos minutos depois, após uma trepada com seu aluno russo, a garota é seu nome em espírito, e isso é sugestivo demais. Com isso, Solondz pretende apontar que para nós, a felicidade não vai de dentro para fora e sim de fora para dentro. A felicidade, hipocritamente nada mais é do que uma boa trepada, que satisfaz o nosso ego, encaixando-nos no padrão de boa vida que a sociedade impôs às pessoas. Fato que é confirmado pela temática do filme aliada a seu nome: sexo; felicidade. A trama é sobre hannah e suas irmãs uma família de classe média tipicamente americana e que no momento está passando por uma fase conturbada em suas vidas.
Os pais vão se separar após décacas de matrim}onio. Eles estão velhos e a mulher não quer aceitar o rompimento, surpreendentemente não por ainda amar o marido, provavelmente ela não ame, mas sim (como o expectador descobriria alguns mnutos mais tarde) por medo de viver o resto da vida sozinha. A mulher diz "Eu não me incomodo de você ter encontrado outra mulher, só gostaria que você tivesse feito isso há vinte anos atrás!", e a frase denuncia o que o diretor e roteirista acredita estar na conciência dos americanos: um sentimento de egoísmo sem precendentes (e em certos excertos de Redacted do Brian fuckingde Palma é mostrado como esse sentimento se comporta durante a guerra, por exemplo). O marido, por sua vez se nega a dizer a verdade diante da mulher, já que realmente ele havia se cansado do casamento e encontrou uma outra mulher. Ora, o que temos aqui é um casamento infiel, falso e egoísta de um casal que está no topo da árvore genealógica do filme e que pode ter passado todas essas características pros demais personagens que se interligariam mais tarde.
Trish é a típica housewive realizada, tem três filhos e um casamento aparentemente feliz, mas essa não se pode esperar que seu marido Bill tenha essa mesma idéia. Psicólogo mas incapaz de solucionar os problemas dos outros por causa de seus próprios demônios pessoais, Bill é um dos personagens mais ousados que já vi em um longa, sai do trabalho e se satisfaz com imagens de um garoto em uma revista infantil, propõe ao filho coisas no mínimo inapropriadas e finalmente o pior, fode um amigo do filho. Homosexual e pedófilo, ele tem vontade de mudar, até tenta confessar o seu distúrbio à mulher, mas não consegue porque além de ser óbviamente uma coisa difícil de se fazer, Bill agora está gostando do rumo que sua vida está levando, afinal, em seus sonhos psicóticos mais recentes houve uma alteração: ele não se mata no final. Colocar um personagem tão doente em meio a uma trama que parecia tão correta nas minhas suposições de início me confundiu, mas agora penso em uma vertenda bastante interessante. Ora, se o personagem mais doentio do filme é com excessão do casal de velhos o único pai de família da história, pode-se entender que todo o seu caráter sexualmente alteradoserá repassado à próxima geração, e é exatamente por esse caminho que o filme segue. Os doutrinamentos que o pai dá ao filho Billy sobre como se comportar no início de sua vida sexual (que ainda está naquela fase um) sugerem que Billy levará consigo o fardo que o pai tem carregado.
Joy é a irmã não realizada da família. Enquanto Trish é bem sucedida (supostamente) na vida familiar e Chloe (próximo parágrafo) tem uma carreira profissional de sucesso, Joy não possui nenhuma das duas realizações e busca desesperadamente uma vida mais digna, tanto que chega a transformar em verso sua tristeza ("happiness where are you? i've searched so long for you"). Joy, por ser solitária, alienou o conceito de felicidade e contentando-se com pouco, chegouu a pensar em certo momento do filme que ela, a felicidade, está diretamente relacionada com uma boa vida sexual. Errou ao pensar que havia alcançado seu objetivo sob a forma de um 'ex-ladrão' russo que passou apenas uma noite com ela. A verdade bateu na cara de Joy com violência e ela finalmente percebeu que uma vida feliz não seria tão simples de se encontrar e serviu como ferramenta que Solondz usa para decifrar esse paradgma social de que o sexo é o que mais importa, algo que começa a ser semeado na vida das pessoas desde a pré-adolescência. O fruto dessa semente é a própria Joy, fracassada, seja qual for o ponto de vista.
Finalmente Chloe é o argumento sobre a tese que acabei de falar. Ela é bem sucedida profissionalmente e tem uma vida sexual ativa, sempre saindo com homens bonitos e desejados, mas sente que algo está faltando em sua vida e é claro, é a felicidade. Mas tragicamente, Chloe não entende o que falta, não compreende do que exatamente precisa para alcançá-la e busca por algo que ela ainda não sabe o que é. Sou tentado então a acreditar que a felicida foi para a vida da Chloe sob a forma grandiosa (hehe) de Phillip Seymour Hoffman, no papel de Allen, um vizinho com pensamentos sadomasoquistas porém psicológicamente destruido o bastante para não ser capaz de realizar nenhuma de suas fantasias. No momento sublime em que os dois se encontram, ao som de uma ópera que me remete à esperança, Chloe rejeita a novidade, porque Allen 'não faz o seu tipo' e descarta aquele homem de sua vida entregando-o à Joy. Rejeita alguém que não é segundo o padrão de beleza ameri, fuck, universal bonito e escolhe por manter a máscara que usa para camuflar o fracasso de sua vida pessoal.

Terminando, no começo do filme Joy rompeu o namoro com Andy e este, revoltado pelo ocorrido amaldiçoa a vida da garota: "until the day you die, you, not me, will always be shit", a todo tipo de merda realmente acontece com Joy. Mas essa cena memorável não abre o filme por acaso, serve de prévia para tudo o que estaria por vir nas próximas duas horas e também dá apoio a um exercício interativo: não é demais pensar que a maldição de Andy ultrapasse a tela e entre na vida de cada um que pensa o mesmo que Joy sobre o ex-namorado ("you think I don't understand fashion? You think I'm not hip? You think I'm pathetic? A nerd? A lard-ass fat-so? You think I'm shit?"). E por último, como a cena final parece sugerir, a jornada em busca da felicidade verdadeira é em vão. O velho pai de família, agora separado, em uma reunião familiar joga sal (leia-se veneno para o seu corpo) em sua própria comida, como se quisesse desesperadamente ficar livre daquele sufoco, acentuado com toda certeza por aquele encontro de família, uma crítica ácida e certeira de Solondz a esses momentos, desconfortáveis no mínimo, para muitas pessoas. Ao fim de tudo, com a ironia que permeia toda a metragem, o filme termina como começou: o pequeno Billy tem a sua primeira ereção e começa ali, naqueles poucos segundos, todo o tipo de problema em sua vida, agora que ele não é mais uma criança inocente mas um adulto em formação; 'eu gozei', ele declara o silêncio que sussede essa declaração é trágico, apesar dos nossos risos, como se a gente já soubesse que o que estava por vir era miséria mesmo. Ponto.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Filmes de janeiro

01. Atonement (Atonement, Joe Wright, 2007) – 4/5
02. Senhores do crime (Eastern promisses, David Cronenberg, 2007) – 4,5/5
03. I’m not there (I’m not there, Todd Haynes, 2007) – 4/5
04. 4 meses, 3 semanas e 2 dias (4 luni, 3 saptamani si 2 zile, Cristian Mungiu, 2007) – 3,5/5
05. Zodíaco (Zodiac, David Fincher, 2007) – 4,5/5
06. Once (Once, John Carney, 2006) – 4/5
07. Entrevista (Interview, Steve Buscemi, 2007) – 4/5
08. Saneamento básico, o filme (idem, Jorge Furtado, 2007) – 4,5/5
09. Os incompreendidos (Lês quatre cents coups, François Truffaut, 1959) – 4/5
10. Zero de conduta (Zero de conduite, Jan Vigo, 1930) – 2/5
11. Jules et Jim (Jules et Jim, François Truffaut, 1962) – 4/5
12. Juno (Juno, Jason Reitman, 2007) – 4/5
13. Eraserhead (idem, David Lynch, 1977) – 3/5
14. As Torres Gêmeas (World Trade Center, Oliver Stone, 2006) – 4/5
15. Cidade de Deus (idem, Fernando Meireles, 2002) – 4/5
16. À procura da felicidade (The persuit of happyness, Gabriele Muccino, 2006) – 3,5/5
17. A Rainha (The Queen, Stephen Frears, 2006) – 3,5/5
18. Brilho eterno de uma mente sem lembranças (Eternal sunshine..., Michael Gondry, 2005) – 5/5
19. Onde os fracos não têm vez (No country for old men, Irmãos Coen, 2007) – 5/5
20. O piano (The piano, Jane Campion, 1993) – 3,5/5
21. Embriagado de amor (Punch-Drunk Love, Paul Thomas Anderson, 2002) – 5/5
22. Seis homens ficando doente (seis vezes) (Six figures getting sick (six times), David Lynch, 1970) – 2,5/5
23. O alfabeto (The alphabet, David Lynch, 1970) – 4/5
24. O gângster (American Gangster, Ridley Scott, 2007) – 4/5
25. A avó (The grandmother, David Lynch, 1970) – 3,5/5
26. Longe dela (Away from her, Sarah Polley, 2007) – 1,5/5
27. O iluminado (The shning, Stanley Kubrick, 1980) – 4/5
28. Persepolis (Persepolis, Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi, 2007) – 4,5/5

sábado, 2 de fevereiro de 2008

Saneamento básico, o filme



Saneamento básico, o filme (Jorge Furtado, 2007) - 4,5/5


Não é a primeira vez que vejo Jorge Furtado fazer uso de metalinguagem. Em 'O homem que copiava', o diretor já homenageava o cinema, se inspirando em Hitchcock e em Kieslowski (e para por aí, porque eu não me lembro mais de muita coisa, afinal, fazem mais de dois anos desde a última assistida). Mas agora, em Saneamento básico, o filme, o diretor estrapola. Agora ele não apenas insere referências - por mais relevantes à trama que elas sejam - sobre filmes, mas fala sobre o cinema, sobre o fazer cinema, sobre quem está fazendo e vendo cinema.
Os diálogos precisos como "quem ia querer ver um filme de saneamento básico" (pulei nessa hora) são apenas o começo. Numa cidade do interior de Porto Alegre (ou Paraná, sei lá), os moradores se unem para exigirem da prefeitura a construção de uma fossa, para resolver o problema de mau cheiro da região. Como não havia verba disponível para tal fim, os moradores recorrem ao jeito brasileiro de driblar as regras, fazendo um filme sobre um monstro da fossa - ver o filme -, pois havia verba para ser destinada à realização de um vídeo.
Quando quatro pessoas que são incapazes de definir corretamente o termo 'ficção' pegam em uma câmera para realizar o tal vídeo, como desculpa para usar o dinheiro na construção que eles necessitam, o objetivo do filme começa a ficar mais claro. Há quem interprete o filme de Furtado como uma crítica aos filmes b de ficção científica, mas eu estou bem longe disso. Primeiro porque pra mim, não há crítica, há documentação. Segundo os pensadores da nouvelle vague, a ideologia era 'câmera na mão e idéia na cabeça'. Segundo os mesmos pensadores, o movimento ia contra o conservadorismo no cinema que, para eles (diretores da nova onda), estava em decadência. Pregavam a idéia de que QUALQUER UM pode fazer um filme. Qualquer um pode inclusive fazer um filme muito melhor do que o da "velha onda". Em Saneamento básico, o bando de vacilões que interpretaram ficção como sendo um filme de monstro criaram uma obra completamente trash e tenebrosamente mal atuada, mas ninguém pode discordar de duas coisas: houve quem gostasse. Desde o personagem suspeito do Lázaro Ramos até a criançada da escola, os aplausos e até as lágrimas não foram poupados. E segundo, aquela cois, filme foi feito com paixão. Ruim - na minha opinião -, mas houve dedicação. E isso é um mérito. O abrangente e o subjetivo, que salvam aqueles 10 minutos mal filmados da clandestinidade estão presentes em todos as obras, em todo o cinema, e os filmes estão talvez diretamente relacionado ao momento, que varia, assim como varia de pessoa para pessoa. Muita gente não gostou, muita gente achou apenas interessante, legal. Mas eu fui tocado por esse filme imensamente simples, tocado por suas idéias, o seu humor (ri pra caralho, ok), a sua decupagem. Posso até estar enganado quanto ao objetivo, mas foi assim que eu me senti. Pra falar a verdade, acho que até estou começando a gostar dO Monstro da Fossa.

Trailer do filme:

Sweeney Todd - the demon barber of the Fleet street



Sweeney Todd..., Tim Burton, 2007 - 3,5/5


Sweeney Todd é um filme do Tim Burton sob todos os pontos de vista. Logo na abertura, um longo traveling vigiado pelos créditos do filme sobre algo que parece ser uma fábrica, praticamente uma refilmagem do oppening que Edward e Fábrica de chocolate, exceto que aqui não há pedaços de metal nem chocolate, e sim sangue, mas isso não faz lá tanta diferença.
O gótico é elemento constante na estética de Sweeney Todd. O cabelo tosco dos personagens principais, a brancura da pele, os olhos assustadores, as lembranças felizes e estranhamente coloridas, tudo parece levar a crer que não teríamos muita surpresa com esse novo Burton, o que não seria nada ruim. Mas o poster não engana (nem o subtítulo, assunto pra daqui a pouco). O tão esperado primeiro assassinato surge repentinamente na tela ao som do violino maravilhoso que acompanha toda a trama, e na tela, sangue, muito sangue, um verdadeiro personagem na trama. Com o desenrolar da história, nos são apresentados os demais esteriótip, personagens: além de Todd e Mrs. Lovett - nome bem sugestivo -, o Juiz que é mau, o garoto que é um pouco mau também, o marinheiro que é chato e a filha de Todd que é insurpotávelmente chata e aqui, já dá pra perceber como errou feio o roteiro ao deixar essa subtrama completamente dispensável e incoerente com aquilo que o resto da história parecia propor - que todo mundo não presta, como uma das músicas (a melhor, by the way) diz. Felizmente, o tempo que o casal ocupa na tela (ah é, o marinheiro e a filha de Todd são um casal) é pequeno e dá espaço para que a parte sangren, boa da história se desenvolva (e quem diria, em um dia).
Mas o que é Sweeney Todd afinal? Eu enxergo daquela maneira mesmo, um retrato altamente pessimista da sociedade que estrapolam nos seus interesses e devoram-se a si mesmo. Não é por acaso que o personagem mais inescrupuloso do filme seja um juiz, que teoricamente deveria defendar a justiça nessa sociedade, mas essa pedece, já que o seu próprio defensor não faz questão de seguir princípio algum. E já que o papo é o juiz (Snape, oi), foi ele quem mandou injustamente Todd para a prisão, destruindo a vida do pai de família, que a partir desse momento, só encontra desgraça em sua vida, tanto que, porra, ele nem chega a ver direito sua própria filha. E já que eu sou desses que tá nessa de nocountryforoldmen, também percebi que todos os personagens mais velhos assim, morreram, né. Acho que de repente todo diretor entra nessas de ficar em crise de idade, não sei (teve o Leone, o Allen que entrou e demorou pra sair, se é que saiu, etc). E por fim, o filme é excelente como musical, as músicas são legais demais, vai. E o ambiente totalmente fantasioso da Londres sec. XIX é perfeito pro clima que se espera do filme.

Trailer do filme: